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Crônica: Cordão de Ouro O Filme

Sob todos os aspectos apesar de quase nenhuma CAPOEIRA, o filme CORDÃO DE OURO é um marco divisor na filmografia brasileira. Antes dele os jovens em geral (mulheres á parte) só tinham para a sua diversão chanchadas-pornô ridiculas, sem graça nem enredo, sacanagem explicita a titulo de cinema nacional e como filme de CAPOEIRA citava-se apenas o PAGADOR de PROMESSAS (1961) que quase nimguém viu, enquanto obras antigas feitas com BIMBA e PASTINHA nos eram completamentes desconhecidas na época. Comentario de Nato Azevedo, a seguir eu Renato Azevedo o LEITEIRO relato minha experiência participando do HISTORICO registro no ano de 1976 no Rio!

ATOR POR UM DIA – AS FILMAGENS

Conheci NESTOR CAPOEIRA através do meu Professor LUA RASTA em uma manhâ ensolarada, num camping a beira-mar por volta de 1975, me foge a memoria como, só sei que das outras vezes que tornei a vê-lo nos tratamos como velhos amigos, então quando o falecido RUBINHO TABAJARA me convidou para participar de um filme com NESTOR & ZEZÉ MOTA (sou seu fã) eu vibrei, era a realização de um sonho!

PRIMEIRO DIA Cheguei cedo (6h30) para a filmagem- o onibus só sairia as 7 horas- mas , pasmem o veiculo já estava lá. Saimos no horario outro bom sinal, tudo indicando que ia embalar a minha carreira de artista nacional ou global. Após 2 cansativas horas chegamos ao local da filmagem, lugar muito lindo, todo gramado, do tamanho de um campo de futebol e rodeado de montanhas na cidade de Campo Grande. Atrás das montanhas ficava a rua por onde viemos e uma BAIUCA (pequeno comercio) aonde compramos biscoitos e refrigerante, enquanto esperavamos o jipe que faria parte da filmagem.

Deu 10 horas, deu 11, deu meio-dia e nada do bendito (ou seria maldito) jipe. Estrebuchava- mos de calor e de raiva quando o infeliz apareceu, demorara porque se perdera. Haviam contratado um rapaz da Zona Sul e não lhe deram um guia que conhecesse a Zona Norte, por isso não houve filmagem nesse dia!

SEGUNDO DIA Eu ja sabia que estava em um filme nacional, mas estava determinado a não perder essa chance, assim que começasse a filmagem eu queria aparecer o maximo possivel. Na primeira cena não deu para me promover, mas na segunda "tomada" caprichei. Tinhamos que correr uns 50 metros morro acima em direção ao NESTOR CAPOEIRA, isso com a camera nos filmando pelas costas. Saí pelo meio e cheguei por ultimo. Depois a câmera foi la para cima do morro ,e filmava por tras do Nestor enquanto corriamos em sua direção.

Passei "sebo nas canelas", botei 10 no coelho e ao sinal de AÇÃO, disparei. Só não cheguei em segundo, porque era o meu amigo RUBINHO quem estava na minha frente. Rubinho "morreu" com um arrastão, eu levei uma rasteira e enquanto o NESTOR cuidava de outro guarda, me levanto e tento lhe dar uma chicotada, apesar de todos os guardas portarem revolver, armas de verdade! No que ele me da um martelo, (vide foto) caio em cima do pé dele que esta sobre um formigueiro. Tivemos que ficar uns 10 segundos imoveis, enquanto isso as formigas invadiam o meu macacão e "almoçavam" o pé do NESTOR.

Um providencial OK nos salvou! Apesar da presença de ZEZÉ MOTA no "SET" oque mais nos chamou atenção nos 3 dias de filmagens, foram 2 negros da turma de escravos, um Ricardo de uns 15 anos quase 1,90m de altura e uns 80 kilos impressionava, e junto com o outro baixo e magro, uns 25 anos e expressão de calma maquiavélica, formavam a "dupla dinamica" do "SET"(?) de filmagem, que por sinal não tinha banheiro nem agua!

Este segundo dia de filmagem foi um irritante teste de paciência, pois DEUS querendo "aparecer" mandou-nos interminavel sequência de nuvens. Abre lente, fecha lente, bota filtro, tira filtro…chegou finalmente a bendita hora do almoço. E espera, espera, espera…lá vem a kombi! Olhos cheios de esperança, boca aberta cheia de dentes.. abre-se a porta do veiculo; Uma revoltante montanha de sanduiches com refrigerante, a gritaria foi geral, olhei para a "dupla dinamica" e pensei: Vai começar a pancadaria!

Mas nada aconteceu e depois eu soube que enquanto torravamos o" miolo no sol", eles fantasiados de escravos- calça de pijama listrado- tinham ido a BAIUCA onde "aplicaram" de grandes artistas enchendo o bucho de graça! A choradeira deu resultado, pois o jipe fez uma "feira-relampago" voltando abarrotado de frutas, mas estacionou para nosso azar bem ao lado das 2 "ovelhas negras". Assim que o motorista se afastou, eles pegaram o jipe e se mandaram para dentro da mata, voltando mais tarde sem o jipe é claro!

Quem foi ver o "estrago" disse que metade das frutas só dava para fazer suco. Infelizmente não se podia mandar os 2 projetos de bandidos embora, porque eram eles os chefes dos escravos, os que iriam salvar o NESTOR dos guardas!

TERCEIRO DIA Enfim DEUS que é brasileiro descansou e pudemos terminar as filmagens, cuja ultima cena era bem simples. NESTOR CAPOEIRA saltava do jipe, e um guarda corria uns 7 metros em sua direção, sendo perseguido por um escravo com uma foice de madeira – que tinha numa das faces da lâmina uma bolha de mercurio- com a qual atingiria a costa do guarda, "matando-o" a uns 2 metros do NESTOR.

Para o papel do escravo foi escolhido o sinistro magro da dupla dinamica, e para o do guarda adivinhem quem? APOLINÁRIO!

Meu amigo Apolinário era um jovem mineiro com uma voz esganiçada, que se tivesse veia cômica, seria substituto do Costinha, mas tinha um grave defeito para o papel: SIMPLESMENTE CORRIA DEMAIS!

Só por isso estava no Rio de Janeiro, pois havia ganho de uma universidade local uma bolsa como atleta. E começa a pantomina: Ao comando de ação Apolinario dispara, ambos passam pelo NESTOR e vão mais uns 30 metros além. O diretor orienta Apolinário a corrrer menos.

La vão os 2, mas novamente ultrapassam NESTOR. Na terceira vez o diretor grita "AÇ.." o escravo se adianta, e mal Apolinario dá 2 passos, leva uma madeirada na costa, mas ao invés de cair vira-se para o rapaz e protesta: "Que qué issso negão?". Trocou-se o macacão sujo de tinta vermelha, e o capeta repetiu a dose, desta vez quebrando a foice de madeira na costa do pobre Apolinário.

Olhei para o rosto do "distinto" e não vi nem sombra de um sorriso. Houve troca de macacão e novas repetições, agora com foice de ferro, num total de 7 vezes. Após o almoço recomeçam as filmagens, quando derepente invade o local um "coração de mãe", caminhão-poltrona da Policia Militar com uns 20 PMs. Pensei que tinhamos invadido propriedade particular, mas me enganei, queriam levar a dupla dinâmica, pois haviam assaltado a BAIUCA do mesmo comerciante que lhes "enchera o rabo" de biscoito no dia anterior.

A Direção do filme contornou o problema , derepente uma grande surpresa, chega a PROXIMA VITIMA: ZEZÉ MOTA!

Simpatia em pessoa, lindisssima numa bota de couro branco, ZEZÉ viera participar das filmagens, e provavelmente trocou de roupa no nosso ônibus. Finda as filmagens, os diretores doidos para irem embora, se entupiram numa kombi com os equipamentos, e nós entramos no ônibus. ZEZÉ que foi a ultima a entrar perguntou: GENTE, ALGUEM VIU MINHAS BOTAS?
Nas nossas cabeças brilharam 2 palavras: FORAM ELES!
Ela dá o ultimato: O ONIBUS NÃO SAI ATÉ QUE AS BOTAS APAREÇAM! Passados uns 15 silenciosos minutos, nós cheios de ódio e com a barriga cheia de fome, vimos surgir o "PASSAPORTE" para continuar a viagem: As benditas botas brancas, agora zebradas de graça pois tinham sido escondidas no motor traseiro do ônibus. Não sei como ZEZÉ se sentiu, mas eu quase tive um ataque cardíaco!

O onibus se tornou um mausoléo, mas no meio da viagem ele para, abre-se a porta e entram 2 diretores, um deles com um "garnizé" (galo ao contrário) na testa ou afundamento de crânio, que deve ter inspirado ao NESTOR, o titulo do livro GALO JA CANTOU. Na pressa de irem embora, a kombi batera mandando meia duzia para o hospital.

O FIM DA HISTÓRIA Após uns 3 meses de telefonemas, idas e vindas, consegui receber por minha participação no filme. Gastei bem mais tentando receber do que ganhei por fazer o filme, pois a empresa Lanterna Magica Produções, fez a magica de deixar na "lanterna" da folha de pagamento os que ela devia, para ver se eles desistiam. Eu não quis ir a PRÉ-ESTRÉIA, deixando para saborear meus minutos de glória, no lançamento do filme nos cinemas. Triste destino o meu!

Portal Capoeira Crônica: Cordão de Ouro O Filme Publicações e Artigos O CORDÃO que era de OURO, após a pré-estréia VIROU LATA, e eu pude ver só uns 10 anos depois, que os meus MINUTOS DE GLÓRIA tinham virados MÍSEROS e IRRECONHECIVEIS 10 SEGUNDOS. Por SORTE, o fotógrafo que registrou a foto, que esta na contra-capa do PEQUENO MANUAL do JOGADOR de CAPOEIRA do NESTOR CAPOEIRA, só foi impedido de fotografar as cenas do filme, logo depois desta foto, porque o "CLIC" da máquina estava entrando na trilha sonora.

O DIA DA PRÉ-ESTRÉIA por Nato Azevedo A pré-estréia foi no ultimo cinema de Copacabana no Posto 6, não me lembro o nome no fim do ano, 400 ou mais lugares completamente tomados pela galera capoeirista. Recebemos todos um questionário (que virou aviãozinho na sala escura) e um lápis para anotar as opiniões sobre o filme. Foi uma bagunça geral, muita conversa durante a projeção, um zum-zum-zum danado e até algumas vaias não sei bem porque.

Adorei o filme de cenarios naturais belisssimos, um maculêle & bumba-meu-boi empolgantes, e um enredo futurista bem plausivel. Infelizmente se CORDÃO DE OURO foi lançado no circuito comercial não ficou muito tempo, pois dizem que o produtor Antonio Carlos Fontoura, nome respeitado no mundo cinematografico, receando a rejeição do filme não o colocou em cartaz!

 

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Leiteiro – [email protected]

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