São Bento na Capoeira

 
Crônica fazendo uma analogia entre "São Bento" e a Capoeira
 
 
Papa Bento XVI e
 
SÃO BENTO dA CAPOEIRA

"Canarinho da Alemanha, quem matou meu curió?"
 
"O segredo da Lua quem sabe é o clarão do "Só"
 
 
Na volta que o mundo deu, na volta que o mundo dá, eis que temos um novo papa, o Senhor Cardeal Joseph Ratzinger, alemão de nascimento.
 
De uma associação de idéia banal, relacionando um canto tradicional da capoeira ("Canarinho da Alemanha") com a nacionalidade do novo Papa, surgiu uma associação bem mais profunda. Afinal, os capoeiras não poderão deixar passar sem registro esta feliz escolha de nome – Papa Bento XVI – que, quase que naturalmente nos transporta para o velho São Bento da Capoeira.
 
Até porque, outra curiosa coincidência, o tema Capoeira & Religiosidade está na ordem do dia.
 
De pronto, com exceção do católico praticante, os praticantes das demais religiões, especialmente das religiões de origem africana, perguntarão:
 
– Mas por que São Bento?
 
Quando o velho e saudoso Mestre Caiçara cunhou a frase "roupa de homem não dá em menino", talvez não tivesse percebido a sua grandeza total, já que a frase serve também para o mundo religioso. Os ritos afro-brasileiros, por exemplo, praticamente nasceram juntos com a Capoeira Brasileira. Merecem, merecerão sempre, respeito, admiração e prioridade quando o assunto for Capoeira e Religião.
 
Estamos atentos a esta "obrigação", vários artigos virão a respeito, inclusive, sempre que possível, estaremos lembrando a importância de todo e qualquer evento capoeirístico nacional e internacional, realizado no Brasil, incluir uma visita a um Ilê, a uma Roça ou a um Terreiro. Já escrevemos sobre isto, sugerindo que os eventos internacionais que estão sendo programados para Salvador, Bahia, no fim do ano, não só trabalhassem em conjunto, como incluíssem na programação (se possível única) uma visita a um candomblé. Sendo o mais cotado, adiantamos no artigo de então, e adiantamos agora, ainda de acordo com a frase de Mestre Caiçara, será, certamente, o internacionalmente conhecido Ilê Axé Opô Afonjá, da ialorixá Mãe Stella de Oxossi (Maria Stella de Azevedo Santos). Ainda em Salvador, Bahia, longe de esgotar uma longa lista, nós lembraríamos a Mansão do Caminho, que segue uma outra linha religiosa, fazendo um trabalho comunitário absolutamente extraordinário.
 
Não fosse fugir demais ao tema deste artigo, daríamos exemplos em vários outros estados e até mesmo por toda América Latina, do Uruguai a Cuba, no Caribe.
 
Mas voltemos ao nosso Senhor São Bento.
 
Em 1999, em uma de nossas visitas à academia de Mestre Jequié, discípulo do angoleiro Paulo dos Anjos, em Ubatuba, São Paulo, dele recebemos uma preciosa fita K-7 de presente. Uma espécie de mini-documentário, elaborado por mestre Damionor Ribeiro Mendonça (à esquerda, na foto com Mestre Artur Emídio). Parte do documentário tratava exatamente do tema "Capoeira & São Bento".
 
Damionor Mendonça foi um dos responsáveis pelo processo de institucionalização da Capoeira, mais especificamente para que a Capoeira fosse reconhecida como arte marcial e como esporte. Artur Emídio foi quem preparou Mestre Mendonça, como preparou também – e muito bem! – os mestres Paulo Gomes, Celso da Rainha e tantos outros.
 
Mendonça produziu, e continua produzindo, diversos documentos, sob a forma de textos e gravações em K7, sobre temas correlatos à nossa Capoeiragem. Vamos a alguns deles:
 
Livro "A ética na Capoeira"
Jornal "O Berro"
"Cantos de Roda" (Livreto e fita K7)
Histórias da Capoeira (conjunto de crônicas)
São Bento na Capoeira (fita K7).
Na fita K7 sobre "São Bento na Capoeira" Mestre Mendonça faz uma análise sobre a importância – e possível relação – de São Bento com a Capoeira e com os Capoeiristas. Segundo Mendonça argumentos que permitam tal análise é o que não faltam, pois vão desde cantos (chulas, ladainhas, corridos e louvação), toques de berimbau e estilos de jogo (São Bento Grande, São Bento Pequeno, São Bento Amarrado, São Bento Repicado, São Bento de Angola), até mesmo a associação do capoeira com a cobra. Lembrando que São Bento nos protege da picada de cobra, sendo que, na Capoeira, a cobre pode, simbolicamente, ser assemelhada a nosso camarada não tão bem intencionado.
 
Curiosamente, mas não por coincidência, ao ouvirmos o CD de Capoeira Angola do saudoso Mestre Gerson Quadrado "Encanto Banto num Recanto da Ilha", de entrada o mestre pergunta quase repreendendo:
 
 
"Vocês conhecem São Bento?
 
Vocês não conhecem São Bento?
 
Ôche! É capoeira e não conhece São Bento?.."
 
 
Conversando com Mestre Jaime de Mar Grande, um dos grandes responsáveis pela reintegração de Mestre Gerson Quadrado a Capoeira, ele nos confidenciou que Gerson Quadrado era devoto de São Bento, sendo que São Bento é o protetor do Capoeira.
 
Havendo ou não relação entre São Bento e Capoeira, o que podemos dizer é que, ao se achegar ao pé do berimbau, nunca deixamos de fazer nossa prece para que o santo não deixe de proteger.
 
 
"Valha me Deus Sinhô São Bento
Vou jogar meu barravento
 
Valha me Deus Sinhô São Bento
 
Buraco veio tem cobra dentro"
 
 
Voltemos ao início para finalizar. Aproveitando que nossa nova Santidade o Papa assumiu o codinome de Bento XVI, vamos pedir para que ele nos dê sua proteção, para que a Capoeira do Brasil alcance, finalmente, um lugar ao Sol. E que consigamos ver desvendados, mesmo que tardiamente, os mistérios que envolvem os programas de capoeiras patrocinados pelo Governo Federal, muito especialmente este intrigante e ambicioso Programa Nacional e Mundial de Capoeira!
 
Sendo o Senhor Ministro da Cultura, Administrador Gilberto Gil, um filho de Xangô, o Orixá da Justiça, há chance deste milagre acontecer.
 
Valha-nos Deus, Senhor São Bento!
 
 
Miltinho Astronauta
 
 
Jornal do Capoeira
Piracicaba, Maio/05

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