A VIOLÊNCIA NA CAPOEIRA
JUSTIFICATIVA
A violência é o campo onde se desenvolvem as manifestações sociais neste ciclo histórico de globalização, expansionismo e imperialismo capitalista, militar e tecnológico, repetindo a decadência do Império Romano. As mensagens que transcrevemos abaixo, recebidas pela Internet, bem traduzem a preocupação e o receio que vem se apossando dos praticantes da capoeira-esporte, sem falar naqueles que, como eu, provêem dos antigos e saudosos tempos da capoeria-jogo.
A capoeira transplantada de sua origem, alienada da sua cultura materna, vem se transformando num instrumento de retorno ao circo romano, em sua plenitude bárbara, sem código, sem leis, desprovida dos mais rudimentares princípios de civilidade, sem governo e sem piedade.
Trazemos o assunto à baila, abrindo espaço para o debate democrático, sem preconceitos, sem mágoas, sem procurar atingir um companheiro, guardando ética e etiqueta, para avaliar a gravidade do momento, estabelecer uma pausa para meditação sobre as suas verdadeiras causas e decidir o melhor caminho para evitar os fatos que se avolumam em nossa comunidade.
OS TRÊS "ERRES" DA CAPOEIRA!
Capoeira é uma palavra estranha, que se escreve com um "rê" suave se pratica com três "erres" fortes.
O primeiro é o RITMO, o segundo o RITUAL, o terceiro o RESPEITO !
Sem os quais não se joga
… nem se aprende …
a capoeira!
A. A. Decanio Filho
PROTESTO CONTRA A VIOLÊNCIA
Jeronimo Santos da Silva
Axé Capoeira!!
Venho através desta relatar um incidente vergonhoso e covarde ocorrido no dia 19 de abril de 1998.
Após chegar de uma viagem pelo Brasil, fui convidado a participar de uma roda de Capoeira de demonstração ao público em Sydney, Austrália. Esta roda fazia parte do evento de Batizado e graduação do Sr. Edval Santos, vulgo "mestre Boa Morte" natural de Salvador, e residente em Melbourne. Esta roda foi realizada em Sydney em frente ao Bondi Pavilion, Bondi beach. A primeira parte do dito Batizado foi realizada na cidade de Melbourne.
Entre outros convidados constavam as presenças de mestre Barrão – Vancouver – Canadá, mestre Amém dos Santos, figurante do filme "Only The Strong" (ou Esporte Sangrento, no Brasil) que reside em Los Angeles – USA, e um certo mestre Ousado (não o conheço pessoalmente) residente em Londres. Todos, com exceção de Marcos Barrão, amigos próximos de "mestre" (??) Edval.
Para encurtar a história gostaria de me apresentar como mais uma vítimas da violência e desrespeito provindos de capoeiristas irresponsáveis (vulgos mestres de Capoeira) que infelizmente ainda circulam impunes nestes eventos nacionais e internacionais de Capoeira.
Parece até piada de mau gosto. Passei 6 semanas no Brasil jogando Capoeira nos meios mais diversos. Até em favelas eu circulei passando pelo Rio, São Paulo, Manaus e Belém sem nada de grave ocorrer nem sofrer um só arranhão.
Foi de volta em casa entretanto, no primeiro mundo, que venho a sofrer esse tipo de atentado covarde. Eu acabava de chegar de uma viagem de mais de 18 horas de vôo e cordialmente fui participar da roda e prestigiar o evento. Dei boas vindas aos visitantes e fui em seguida atingido com um pontapé brutal no olho direito pelo capoeirista Amém dos Santos nos primeiros segundos do jogo canalha e sujo que me "convidou" a fazer.
Após passar a noite em um hospital de emergência fui operado no dia seguinte por um cirurgião plástico. Estou passando bem no momento e minha visão felizmente não foi afetada. Meu corpo é fechado e minha mente sã!! Axé baba!!
Pra voces que não sabem, o tal do Amém dos Santos mora nos EUA fazem muitos anos e não conseguiu ainda se educar.
Conforme suas palavras eu (não saí da frente do seu "golpe sangrento") e o irresponsável não teve talento nem competência técnica para conter sua selvageria na roda.
O público presente ficou estarrecido com o acontecimento brutal. Havia crianças e famílias. Foi muito sangue que correu na minha face e minha filha Marina, (7 anos) presente na roda, ficou chorando abalada e sem entender o que se passara com o pai.
A comunidade brasileira na Austrália (e a Capoeira) infelizmente foi "graduada" (batizada?!) neste dia com uma medalha (ou cordel?!) de vergonha.
Conforme as más línguas foi tudo "coisa armada" da parte de Edval para finalmente (e sem êxito) tentar provar quem é o bom na roda da Austrália. Que Capoeira boa pra defesa pessoal é essa que ele promove: bate e tira sangue em roda de apresentação ao público!! E eu que não aprovo esse tipo de jogo e atitude na Capoeira que promovo tinha que levar um susto na roda!! Infelizmente só deu pra demonstrar foi um grande excesso de burrice e arrogância da parte do Edval e seu grupo "Filhos Da Bahia".
O tiro saiu pela culatra!! Não corri da raia, como diriam outros, e respeitei a presença do povo presente sem revidar de pronto a "gentileza" oferecida: Amém!! Graduei minha arte na vida e jogo com a Capoeira na "Real" — dinheiro no bolso, respeito ao próximo e educação! E não costumo me rebaixar a esse nível de deslealdade na roda (falta de camaradagem) pra provar que sou um bom mandingueiro.
Pois é, o covarde do Amém partiu bem cedo (escapou?!) de volta aos EUA na segunda dia 20 de abril. Eu ainda estou checando a possibilidade de "jogar" na roda com um processo legal em cima dele ou do responsável (irresponsável) pela promoção desse evento de tão baixo teor cultural.
E como já estava programadovou seguir na sexta-feira próxima ao Canadá e atender ao convite para prestigiar o Batizado que o Marcos Barrão estará promovendo em Vancouver nos dias 24, 25 e 26 de abril.
Sigo depois para os EUA para ministrar alguns workshops em Iowa e San Diego. Que o meu olho arrebentado e agora costurado possa servir de exemplo de Protesto contra a violência que muitos covardes e incompetentes sem talento e com mentalidade provinciana (que se in-titulam "mestres" de Capoeira) ainda promovem pelo mundo afora.
Esta carta serve como uma nota de aviso aos que por acaso venham a ter nos seus Batizados e nas rodas de Capoeira gente de tão baixo calão espiritual e moral… sem talento ou responsabilidade para jogar com a verdadeira arte da Capoeira na roda da vida atual.
Fica portanto registrado mais uma vez o meu apelo de protesto contra essa onda de violência absurda e imoral nas nossas rodas e eventos de Capoeira. E agradeço a todos vocês pela divulgação desta nota nos vossos meios sociais, quilombos e perante suas famílias. Meu muito obrigado pela atenção prestada. Meu Axé a todos vocês.
JERÔNIMO SANTOS DA SILVA – http://www.users.bigpond.com/SS.Jeronimo/index.html
O DIREITO DE BRINCAR
Ari Roizenblit
Eh dificl saber o que ? importante com relacao a capoeira. Eu sou aluno do Paulo Gomes de Sao Paulo e ja presenciei muito desta violencia e ate mesmo participei. Mas desde que cheguei aqui em Sydney tenho visto a capoeira como veiculo para unir os brasileiros em torno de uma cultura alegre e bonita, mostrando uma arte marcial alternativa. Esta forma de brincar de capoeira nos destaca de uma forma positiva como grupo de pessoas, principalmente com tantos grupos diferentes etnicos e de imigrantes. O mesmo nao ocorre em outras partes do globo onde existem grupos grandes de brasileiros, que sao mal vistos como grupo. A violencia na capoeira serve para nos colocar no mesmo saco que kickboxing e outros. Para quem gosta bom, eu mesmo ja fiz taekwendo, mas prefiro a capoeira pela ideia de fazer um jogo a dois, e nao uma ideia individualista de quebrar meu parceiro. Como ocorreu com o Jeronimo, eu tambem fui muito bem recebido em diversas rodas de capoeira na California e tambem pelo mestre King Kong em Salvador. Capoeira fechada, com respeito. Como o Jeronimo, entrei numa roda em Bondi Beach para brincar de capoeira e levei uma rasteira do Edval. Nos segundos que se passaram, muita coisa se passou pela minha cabeca. As antigas rodas de capoeira, salas do besouro que o Paulo Gomes usava para treino, todas as tecnicas sujas. Mas preferi honrar o espirito brincalhao da capoeira de praia e de publico. Cumprimentei o Edval e simplesmente me retirei de sua roda tao inamistosa.
Apoio o Jeronimo, principalmente na defesa do nosso direito de brincar.
Ari Roizenblit
SOBRE O MESTRE AMÉN
Subject: Violencia na Capoeira ??
Date: Fri, 8 May 1998 12:19:36 -0300
From: "piter" <[email protected]>
To: <[email protected]>
CC: <[email protected]>
Caro Mestre Decânio,
Primeiramente gostaria de parabeniza-lo pela exelente pagina sobre Capoeira na internet, uma das melhores que existem.
Lendo em sua página o artigo sobre a violencia, mas precisamente na carta do "Mestre" Jêronimo Santos da Silva, não o conheço, mas acho que ele se equivocou em escrever aquilo sobre o "Mestre" Amém, pois eu tive a oportunidade de conhece-lo e conviver com ele um ano e meio de minha vida na Capoeira chegando a participar de muitos batizados aonde haviam diversos Capoeiristas de várias partes do mundo e nunca sequer vi "Mestre" Amém entrar em atrito com ninguém. Veja bem não quero criar nenhuma polêmica mesmo porque sou uma
criança no mundo da Capoeira, mas acho que o "Mestre" Jeronimo poderia esclarecer melhor o fato ocorrido naquele dia, pois tenho certeza que o "Mestre" Amém não machucaria ninguém que JOGUE Capoeira com ele. Sem mais pelo momento, agradeço ao senhor pelo ótimo site que venho sempre buscar novas informações.
Um abraço,
Piter
TEMAS PARA MEDITAÇÃO
PALAVRAS DO MESTRE
A. A. Decanio Filho
TODOS OS MESTRES CANTAM
"Baraúna caiu!"
"Quanto mais eu!"
"Quanto mais eu!"
BIMBA, MEU MESTRE, BEM ME DIZIA
Negativa, rasteira e queda fazem parte do jogo de capoeira.
A negativa é o preparo para cair,
com segurança e elegância.
Capoeirista pode cair….
sem se machucar… como o gato!
sem sujar a roupa…
macio como flor de algodão! FEIO É CAIR DE BUNDA!
PRÁ BATÊ NOS OTARU!
(Para bater nos otários)
A. A. Decanio Filho
Bimba ao falar sobre a eficiência da regional sempre enfatizou o elemento surpresa como fator decisivo, evidenciado na sua expressão:
"A regioná num seuve pa brigá c’us companhêro…
é prá batê nos otaru!"
(A regional não serve para brigar com os companheiros… é para bater nos otários!)
POR QUE …
todos os capoeristas conhecem seus recursos e limitações, tão bem quanto as esquiva e defesas,
enquanto os que desconhecem a sua prática (os leigos ou otários) podem ser surpreendidos pelos seus movimentos!
A primeira parte da frase acentua a importância do companheirismo que deve existir entre seus alunos, mais evidente noutras recomendações corriqueiras no meu tempo:
"A luta regioná num seuve p’a brigá cum ôtru regioná1, é bom prús otáru…
cúns colega a gente joga regioná…"2
"A genti num deve lutá nu berimbau, deve jogá3!"
Obviamente Mestre Bimba não preconisava "lutas" entre os seus alunos, até para não afastar da academia os mais tímidos e assim perder a renda mensal……
O "esquenta-banho" servia para treinamento de defesa pessoal, de movimentos proibidos sob o ritmo de berimbau, para treinamento de manobras novas, como "tira-teima", drenagem da agressividade ou diferenças pessoais, logo arrefecidas pelo banho frio sob o jato d’água do cano do banheiro, especialmente quando alguém "entrava pelo cano" durante o "esquentamento"…
O Mestre jamais aceitaria a desunião e o enfrentamento dos irmãos,
que deveriam formar uma única família, a dos filhos de Bimba!
1 A luta regional não serve para brigar com outro regional, é bom para os otários… com os colegas nós jogamos a regional.
2 Não devemos lutar no berimbau, devemos jogar!
3 A luta regional não serve para brigar com outro regional, é bom para os otários… com os colegas nós jogamos a regional…
ORIGEM E PREVENÇÃO DA VIOLÊNCIA NA CAPOEIRA
A. A. Decanio Filho
O estilo da capoeira depende principalmente, pela própria natureza deste jogo, do toque do berimbau, dos cânticos, do coro e do acompanhamento de palmas pela assistência, além do estado de espírito dos parceiros na roda.
No estado atual de evolução da "regional", o ritmo acelerado, o calor das palmas e do coro, obrigam os parceiros a um jogo extremamente rápido, que não permite sequer o gingado correto, dificulta o golpe de vista, impede a execução do movimentos com segurança e a visualização do objetivo do ataque, não permitindo sequer as esquivas e defesas seguras.
A preocupação em soltar os golpes em detrimento das esquivas, do gingado e da sincronia com toque do berimbau, vem deturpando os fundamentos do jogo de capoeira e gerando um estilo violento e potencialmente muito perigoso para os seus praticantes.
Além dos acidentes de maior ou menor gravidade durante a prática da "regional", hoje infelizmente tão freqüentes, encontramos algumas falhas de caráter técnico associadas, que tentaremos enumerar e discutir.
O afastamento excessivo entre os pés, o movimento de balanceio maciço do tronco e fuga para traz, impedem a distribuição do peso do corpo entre os dois pontos de apoio, impedindo os giros de cintura nas esquivas e descidas defensivas durante o gingado.
A falta dos movimentos de esquiva para baixo, negativa e cocorinha, possibilita o emprego dos movimentos de ataque de contra-ataque de membros superiores (socos. galopantes, asfixiantes, bochechos, telefone, etc.), mais fáceis e mais violentos, porém contrários à natureza e aos princípios éticos da capoeira.
A violência é decorrente da falta do gingado, da atitude mental de ataque, subseqüentes ao ritmo excessivamente rápido dos toque de berimbau, levam a um jogo a extremamente agressivo, impedindo o floreio e as esquivas típicas da capoeira.
Dentre os movimentos de esquiva destacamos a falta da cocorinha, movimento muito apropriado para a prática da rasteira, outro elemento pouco encontradiço nos jogos atuais.
Um defeito que estamos observando na cocorinha é aquele do apoio nas pontas dos pés, em lugar do assentamento das suas plantas no solo, como recomendava Bimba, que além de melhor apoio, produz o alongamento dos músculos das panturrilhas, melhorando a flexibilidade dos movimentos e a agilidade.
Outro defeito é a queda para traz durante a cocorinha, em "queda de quatro" ou "movimento de aranha", sempre condenado pelo Mestre, que, além de tornar os deslocamentos e esquivas lentos, expõe o peito e ventre indefesos aos ataques mais violentos do parceiro.
A defesa por bloqueio, adquirida do karatê e jiujitsu, em lugar da defensiva por esquiva acompanhando a direção do ataque e proteção do alvo pela mão em movimento, enrijece o corpo, diminui a agilidade e propicia maior impacto ao receber o golpe traumático.
O afastamento excessivo entre os parceiros permite movimentos violentos, descontrolados, despropositados, inócuos por não poderem atingir o alvo dado o distanciamento, porém que ao alcançarem, acidentalmente, pontos vitais podem causar lesões graves ou morte.
Perdemos assim o carater festivo da capoeira antiga e evoluimos (?) para um estilo mórbido, capaz de gerar a morte de parceiros que deviam estar irmanados por um esporte tão belo e pacífico.
A propósito da prevenção dos acidentes e óbitos, devemos lembrar os conselhos encontrados em "A herança de Pastinha" que transcrevemos a seguir.
1.4.21 – "aprender municiosamente às regras da capoeira"
"… todos aqueles que queira se dedicar a esse esporte, que como capoeirísta; quer como juiz? Deve procurar municiosamente ás regras da capoeira de angola"; para que possa falar ou dicidir com autoridade. Infelizmente grande parte de nossos capoeiristas tem conhecimento muito incompleto das regras da capoeira, pois é o controle do jogo que protege aqueles que o praticam para que não discambe exesso do vale tudo,"… (8a,15-23;8a,20-23;8b,1-2)
Pastinha sabiamente reitera, é indispensável um código de honra a ser obedecido pelos capoeiristas! "é o controle do jogo", pelo juiz, pelas regras, regulamentos e "pelo ritmo da orquestra", que evita a violência e os acidentes" .
Vale a repetição!
1.4.22 – "a capoeira vem amofinando-se"
… "e a capoeira vem amofinando-se quando no passado ela era violenta, muitos mestres, e outros nos chamavam atensão, quando não estava no ritimo, esplicava com decencia, e dava-nos educação dentro do esporte da capoeira, esta é arazão que todos que vieram do passado tem jogo de corpo e ritimo."… (9a,1-9)
Continua a insistência na presença dum juiz, árbitro ou mestre de cerimônia para acompanhar a evolução do jogo e advertir ou interromper a prática, ante manobras proibidas, perigosas, desobediência ao ritmo do toque, cansaço do atleta, além de garantir a segurança física dos praticantes e da assistência e finalmente, assegurar a beleza do espetáculo!
1.422 – "todos os capoeiristas são maus?!
…"todos os capoeiristas são maus para seus camaradas? Mais não são todos, sim, no meu Centro tenho, e como conheço muitos que são educado; e não procura irritar ao companheiro: sim, é porque o mestre não interessa a irritação, e o procura o jeito que favoresse a prendizagem, o quer aprender rapido, e não tem enfluensia." (11b,6-13)
Na capoeira, como em todos os grupos sociais, encontramos os que semeiam a discórdia, a violência, alguns por falta de educação, outros por doença mental ou espiritual?! Coitados!
A maioria da juventude é sempre boa, generosa, não sofre as "influências" dos maus, disse o Mestre!
1.4.39 – "Não é permitido"
", por mestre nenhum, se ele mestre for conhecedor das regras da capoeira, não consentir jogar em roda, ou grupo sem fiscal, se não tem como pode ter controle, quem ajuda o campo? não pode entra em combate sem chegar sua vez. Todos os capoeiristas tem por dever obder <obedecer> as regras do seu esporte, cooperando para valorizar, porque, somos responsavel pelos erros, no causo de disputa, ou dezafio, procurar as autoridade é um juiz." (11b,13-23;12a,1)
A insistência do velho mestre na obediência aos regulamentos e regras, na submissão ao árbitrodurante o desenrolar do jogo, coibindo assim os abusos, frutos do entusiasmo, do calor da disputa, de diferenças pessoais, atinge aqui o seu ponto mais alto.
1.4.40 – "não dever ser aplicado"
"Não deve ser aplicado <movimento proibido> e nem forçar o seu companheiro para obter recursos <vantagens> é erros gravissimo, esta sujeito o fiscal suspender o jogo." (12a,1-4)
O reforço da autoridade do juiz, aqui chamado de "fiscal", permite a interrupção do jogo para proteger a integridade física dos participantes. "é fau"!
1.4.41 – "É proibido no jogo"
…"É proibido no jogo e prinsiparmente em baixo, fonsional<aplicar, usar, empregar> golpes, ou truque, não por, é fau.Os golpes que não pode ser fonsionado em Demonstração; golpes de pescoço", dedo nos olhos," cabeçada solta," cabeçada presa," meia lua baixa," Balão a coitado," rabo de arraia," Tesoura fechada," chibata de clacanhar," chibata de peito de pé," meia lua virada," duas meia lua num lugar só," pulo mortal," virada no corpo com presa de calcanhar, presa de cintura," Balão na boca da calça," golpes de joelho e nem truques." (12a,4-16)
Rol dos golpes proibidos, especialmente em demonstrações ou jogos públicos, pelo risco do entusiasmo dos oponentes ou pela tradição.
2.4.42 – "é
"Todos os mestres tem por dever fazer ciente que é falta usar as mãos no seu adversario; se não fizer assim, não prova ser mestre, os que tem educação prova a sua decensia jogando com seu camarada e não procura conquista para enporcalhar seu companheiro, já é tempo de compreender, ajudar do seu esporte, é a judar a moralisar; levantar a capoeira, que já estava decrecendo." (12b,1-10)
Aparece aqui a única diferença entre os estilos de Bimba e Pastinha… Bimba ao criar um sistema de ensino da capoeira, instrumento de luta, abandonou a tradição de não usar golpes traumáticos de mão. Permissão estendida aos balões e projeções, bem aceitos, estimulados, pela difusão das técnica orientais no meio social em que pontificava.
1.4.31 -"para a valentia"
"Não queiram a prender a capoeira para valentia, mais sim, para a defeza de sua intregridade fisica, pois um dia, pode ter necessidade de usa-la para sua defeza. Cuja defeza é contra a qualquer agressor, que venha-lhe ao encontro com navalha, faca, foice e outras armas." (10b,17-23)
A defesa pessoal resulta dos reflexos desenvolvidos ao longo dos treinamentos diários, depende de tempo e persistência… Como a sabedoria dos mais velhos, escondida sob o manto dos cabelos brancos, surge, não se sabe donde, nem como, e nos surpreende na hora certa!
Não se aprende com violência e descontrole… "a pressa é inimiga da perfeição!"
1.5.6 – "a capoeira está dividida e, trez parte"
"note bem, amigo… a capoeira está dividida em trez parte, a primeira é a comum, é esta que vêr ao publico, a segunda e a terceira, é rezervada no eu de quem aprendeu, e é rezervada com segredo, e depende de p tempo para aprender. a prova está no conhecimento da capoeira do passado, e do prezente, a do passado era violenta era violenta, para malandragem, e a de hoje, é como todos verem, rezevamos a mizeria, pela Democracia. nos queremos divirtimento. E tudo mas depende da raça, de quem aprende a capoeira; e a minha raça ja envelheceu, tambem sou tradicional, vivo na Historia da capoeira; e amo ela,"… (14b,8-23)
As três faces da capoeira. aqui referidas são
- a manifestação exterior, o jogo, aparente, exposta a todos presentes, visível nos treinos – mesmo nos chamados "secretos", nas exibições, nas demonstrações. A parte física, corporal, material. "Yin", diriam os orientais!
- as duas restantes são invisíveis, sutis, subjetivas, escondidas "no eu de quem aprendeu" "Yang" na linguagem oriental! O inconsciente e o subconsciente capoeirano! O "istinto" nas palavras de Bimba! As partes secretas, " rezervadas", disse Pastinha. E assim devem ser preservadas!
Uma é mais superficial, psicomotora, os reflexos de defesa, a manha, a malícia. A outra é mais profunda, filosófica, mística,a modificação do modo de viver, "O Axé da Capoeira!", diria minha Ialorixá Konderenê! "Taoista!", diria LaoTsé!
2.2.4 – "Destruir os falsos princípios
"Eu nada aceito, que me venha destruir a teorias arquitetadas, é dever destruir os falsos principios que não constituiram ensinamento: …"(69a,6-10)
Sábia advertência aos que procuram inovar sem respeitar as tradições, sem conhecer a razão dos rituais, sem conhecer a cultura dos povos que trouxeram os fundamentos musicais e místicos da capoeira!
É indispensável estudar a evolução da capoeira, desde as tradições orais africanas, preservadas em nossa cultura pelos seus descendentes até nossos dias, para resguardar o seu precioso valor!
2.2.5 – "procure os bons mestres"
"Todo ser sabio, procure os bons mestres, e va igualar a esse, porque não é aprendiz dos falso ensino; nào possuem em compensação a vaidade, nem orgulho, porque tudo que ele ensina; não é errado: eles tem experiença, e esta observando." (69a,13-17)
Procurar bons mestres para não aprender falsos princípios, nem servir de pasto ao orgulho e à vaidade dos falsos mestres!
Sábias palavras! Capazes de impedir o retorno à barbaria do circo romano, dando a volta por cima do mundo que Deus quis fosse belo e amoroso, diria nosso Mestre Pastinha.
"Eu tirei a capoeira de baixo da pata do boi e vocês estão jogando fora de novo! Não foi isso que eu criei e deixei de herança para vocês!" exclamaria nosso Mestre Bimba, triste e inconformado!
A RASTEIRA NA CAPOEIRA
Lúcia Palmares – Paris/França
Ultimamente, na capoeira no São Paulo e ainda mais na Europa, lamento a quase-disaparição da rasteira. A rasteira foi um símbolo de perícia dos capoeiristas.Era motivo de horas de treinamento na academia. Para conseguir o sucesso de colocar uma rasteira certeira, os capoeiristas trabalhavam o parceiro; existia o floreio, a ginga, as "enganações" que fazem parte da capoeira. Não devemos deixar sumir coisa tão importante da capoeira.
Lembro de um caso que demonstra como considerada era a rasteira, no tempo ainda recente que eu treinava na academia de Mestre Nô.
Um certo aluno, formado depois de anos de aprendizagem, considerou que, com a sua forma física e sua experiência, superava o seu mestre. Desafiou o mestre Nô num sábado a frente de todos os alunos e de diversas visitas. Nô foi para a roda, dizendo que se perdia, ia embora, deixando o aluno senhor da academia. Começou o jogo, num compasso médio, sem cantiga, e demorou bastante tempo. Havia muita tensão; quem tocava, tocava, os demais permaneciam silenciosos.
Havia momentos de superioridade de um sobre outro, e depois virava a vantagem. Nô cozinhou o aluno até dar uma rasteira fantástica que pegou nas duas pernas e mandou o aluno com as nádegas no chão. O aluno com raiva tentou partir para murros, mas os outros impediram. Ele, no final, ficou tão desgostoso que abandonou a capoeira.
É um caso entre muitos que eu vi, que dá para comprovar a importância simbólica da rasteira na capoeira.
Quem não lembra do talento do mestre Canjiquinha, de Um-por-Um (da Massaranduba), de Marcos "Alabama", na rasteira?
Nos batizados, a conclusão do jogo do novato era a derrubada com rasteira, excluindo outras formas de desequilibrantes.
Hoje vemos capoeiras que se dizem excepcionais não conseguirem dar uma rasteira nos alunos que se batizam. Vemos as intimidações dos capoeiras aos novatos, e golpes traumatizantes e balões efetuados sem técnica para derrubá-los. É lamentável ver que a nova geração de capoeiras tem elementos que não se orgulham numa técnica, e ficam tão inseguros na sua arte, que não abrem o jogo (mesmo que fosse no intuito de derrubar) para principiantes de uns meses de treinamento. Quem está assistindo de longe, vê as oportunidades que eles tem de fazer. Eles não o fazem, preferindo os movimentos violentos, para tristeza dos presentes, sejam eles alunos, parentes ou espectadores que conhecem a arte.
Parece, então, que a rasteira saiu do cardápio de muitos capoeiristas. Por que?
Será que novos métodos de treinamento excluíram a rasteira? Será que não faz parte da capoeira moderna? Será que a rasteira exige demais destes novos donos da capoeira? A rasteira pede muita consciência do outro. Assim que já notei, é preciso trabalhar, cozinhar bastante o oponente para que este se jogue num golpe decisivo… que acaba na própria derrubada. É o parecer de um mestre; mas precisa de cabeça, e de tempo.
Os jogos que assistimos tem por objetivo principal de mostrar movimentos. Sejam agressivos ou acrobáticos, não importa, os movimentos superam na mente dos jogadores a tática, a perícia na arte de manobrar o outro.
Em geral, concordamos com os que acham, como mestre Decanio, que o compasso rápido demais e a vontade de se impor num "vale tudo" prejudicam o jogo da capoeira, tirando a ginga, a rasteira, tudo que faz a beleza da nossa arte.
Se, como suponho, a capoeira da Bahia tem alguma coisa para ensinar ao mundo, (em prática para os nossos alunos europeus), é justamente esta coisa original. Por isso, não podemos aceitar ver um elemento fundamental como a rasteira desprezado.
Por isso, desenvolvemos um trabalho básico com nossos alunos, sejam homens ou mulheres, fracos ou fortes, novos ou velhos, no sentido de uma capoeira que se importa com o outro, parceiro e adversário no mesmo tempo.
NOTA: Lúcia Palmares é enfermeira, baiana, nascida em Salvador em 15/5/1955. Foi aluna de capoeira de Norival Moreira de Oliveira, o Mestre Nô, na academia Orixás da Bahia na Massaranduba, a partir de 1971 e recebeu o cordão de professor em 1979. Ensinou na academia Centro Suburbano de Capoeira (rua 2 de Julho, 19, Alto de Coutos) do Mestre Dinelson, de 1980 a 1990. Em 1987 recebeu o cordel de Contra-Mestre entregue pelo Mestre Nô. Em 1992 saiu de Salvador, foi para Santos (SP) continuou ensinando a capoeira trabalhando numa ONG. Em 1995 se mudou para a França. Hoje está começando novo grupo em Paris e pesquisando os aspectos culturais da capoeira. Poderá ser contatada pelo e-mail: [email protected]
TREINAMENTO ESPECIAL DE RASTEIRA
A. A. Decanio Filho
- Importância da posição inicial
Da postura inicial do atacante dependerão principalmente a potência e a velocidade do movimento ou seja o desequilíbrio e a impulsão transmitidos ao objetivo deste movimento. Além do que o desenvolvimento ou a forma de aplicação da rasteira modificar-se-á consoante a postura inicial do seu executante, independentemente da oportunidade de aplicação e da posição do alvo. - Posições iniciais
A rasteira poderá ser aplicada a partir de postura alta ou ortostática, baixa (com ou sem apoio de membro superior no solo) e em grau variável de agachamento.
O uso mais generalizado é a partir duma postura semi-agachada, durante um esquiva descendente.
O seu emprego em ortóstase, embora tecnicamente mais difícil, é muito rápido, seguro, eficiente, inesperado e de certo modo, mais potente; com a vantagem de preparar o praticante para o uso da dourada e das bandas (de frente e traçada). - O gancho do pé
A posição do pé é em forma de gancho em torno do ponto de aplicação da rasteira (colocar fotografia em vários ângulos) - A flexão do joelho
O joelho semifletido aumenta muito a eficiência do golpe, possibilitando o uso simultâneo da musculatura da perna do atacante, auxiliando o deslocamento do da base de apoio do adversário para diante e provocando seu desequilíbrio para trás, enquanto reduz o percurso do movimento do autor. - O calço da perna na rasteira em ortóstase
Durante a aplicação da rasteira em pé (ortóstase), a flexão dorsal do pé em gancho com flexão simultânea do joelho, encosta a porção distal (a mais baixa) da perna do atacante naquela do atacado trava seus movimentos de fuga, enquanto assegura um contato mais firme do pé atacante com seu alvo. - Exercício de rasteira em tração de alça de borracha
A tração, na direção do movimento da rasteira, duma alça de borracha de soro com cerca 0,8 M de extensão, enlaçada no tornozelo do treinando, desenvolve toda a musculatura empregada neste golpe e obriga o praticante a usar todo o corpo nesta impulsão. (Usar fotografia esclarecedora) - Rasteira em cepo
Um pequeno cepo, confeccionado com tronco de madeira pesada, cerca de 0,30 M de diâmetro, com superfícies de corte paralelas, fica suficientemente pesado e equilibrado para ser arrastado com algum esforço num movimento de rasteira para desenvolver a potência muscular e o jeito indispensáveis a execução duma rasteira eficiente. Com a evolução da força e eficiência do praticante o peso e as dimensões deverão variar proporcionalmente.
Rasteira em parceiro sustentado
Um companheiro bem pesado e bem apoiado no solo com as pernas entreabertas, sustentado por trás e pelas axilas por um outro colega, deve ser arrastado e levantado pela rasteira.
Este mesmo método pode ser usado para aperfeiçoamento da "banda-traçada", da "dourada" e da "vingativa de laço", magistralmente praticadas pelo Dr. Cisnando.
Como alternativa podemos usar uma trave de madeira ou ferro, ou ainda uma corda grossa com nós para facilitar a pegada, em o parceiro se segura com as mãos para evitar a queda.
De modo semelhante podemos pendurar um saco forte, com cerca de 1 M de altura, cheio de areia, apoiado pelo fundo no chão para que seja deslocado com a rasteira, dourada, vingativa, banda-de costa ou banda traçada.
Rasteira em parceiro em guarda alta
Em qualquer oportunidade adequada, desde que haja tempo para a aplicação deste golpe desequilibrante, a rasteira poderá ser praticada.
Aqueles que desejarem se aperfeiçoar neste movimento podem fazer treinamento especial em um dos parceiros se abrigue a apenas a esquiva e aplicar rasteiras, enquanto o seu companheiro aplica os golpes que quiser.
Treinamento que deverá ser reservado aos formados de melhor desenvolvimento técnico.
Rasteira em armada solta
Um dos parceiros vai aplicando as armadas soltas enquanto o outro procura derruba-lo com rasteiras, sempre se esquivando em descenso na direção do golpe atacante.
Inicialmente os ataques devem ser mais lentos para desenvolver o golpe de vista, porém a velocidade deverá aumentar progressivamente consoante o grau de aprendizado dos participantes.
Num tempo mais avançado o treino da aplicação da rasteira deverá ser feito durante uma volta comum em que os parceiros jogam sem acerto prévio, procurando cada qual aproveitar a oportunidade de usar a rasteira durante a defesa duma armada solta aplicada por qualquer um dos dois.
- Rasteira em meia-lua de frente
O treinamento da rasteira durante a esquiva em defesa duma meia-lua de frente fez parte do treinamento avançado dos capoeiristas do meu tempo.
É uma manobra muito boa em defesa pessoal, sobretudo porque o aplicador da mlf é pego de surpresa e perde a moral. Poderá ser praticada em parceiro bem treinado em cair sem se machucar ou sustentado por um ou dois companheiros para evitar a queda. - Rasteira em queixada
As anotações anteriores são extensivas a este tópico. - Rasteira em martelo
Todos os comentários a propósito da rasteira em mlf são adequados ao seu treinamento em defesa de martelo, sobretudo porque o atacante com martelo certamente cairá muito mal, dada a natureza deste golpe. Sua aplicação na prática exige muito velocidade portanto um treinamento prolongado. Evidentemente a esquiva descendente deverá ser feita na direção do golpe atacante, com muita velocidade, procurando se aproximar do atacante e sob proteção do membro superior (como na descida em cocorinha) para evitar o perigo do martelo atingir a cabeça do defensor. - Rasteira em galopante, asfixiante, "jab" e soco direto
Da leitura dos tópicos anterior conclui-se facilmente a aplicação dos métodos enunciados aos ataque com os membros superiores. - importante é a repetição iterativa inicial, seguida dum treinamento mais avançado em que um dos parceiros desempenha o papel de agressor enquanto o outro apenas se defende e contra-ataca, para alcançar o estágio final em que ataque e defesa são improvisos.