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A mulher comprou o jogo

Na belíssima crônica “Mulher na capoeira: Claudivina Pau-de-Barraca”, a capoeira brasileira Lúcia Palmares, radicada na França, nos brinda com um relato magnífico que bem ilustra a presença da mulher na capoeira de outrora. De acordo a autora, na capoeira de outrora as poucas mulheres que ousavam entrar na roda eram rejeitadas pelos homens, que viam nisso uma intrusão em seu “território”.

Para demonstrar que as mulheres souberem driblar o machismo e conquistar o seu espaço, Lúcia homenageia mulheres capoeiristas que alcançaram notoriedade como Claudivina Pau-de-Barraca, Rosa Palmeirão e Maria Doze Homens, pioneiras na arte da vadiação, terreno antes monopolizado pelos homens.

A crônica serve de alerta. “Conheci as dificuldades que as mulheres enfrentaram tanto olhares, agressões verbais e xingamentos como desrespeito no jogo de capoeira ou do batuque, por terem tido a ousadia de entrarem naquele mundo sagrado dos homens”, destaca a autora.

De fato, como destaca a autora, há 20 anos era rara a presença da mulher na capoeira. Hoje em dia, em muitas escolas e academias elas são maioria. Mestre Pastinha, disse certa vez, em seu saber profético, que a mulher ainda iria dominar a capoeira. Não é exagero afirmar que a mulher comprou o jogo, entrou na roda, mas não abriu mão de sua identidade. Ao contrário, ao interagir com o vigor masculino, levou para a ginga a sensualidade, o aspecto lúdico, a graciosidade e a beleza estética.

Em tempo de exacerbada da violência urbana, muitas mulheres buscam na capoeiragem um meio de defesa pessoal. Outras a adotaram como terapia para modelar corpo e tonificar a mente. Muitas educadoras ganham a vida no ofício de ensinar a capoeira, enquanto algumas se dedicam ao artesanato temático, fabricando cordas, instrumentos de percussão e indumentária para a prática esportiva. De uma forma ou de outra elas ajudam a redefinir o corpo social que hoje caracteriza a nossa arte.

No entanto, a presença da mulher nas rodas de capoeira ainda é desproporcional à sua participação em instâncias dirigentes como as federações e associações de capoeira. Para alguns camaradas, a presença da mulher é bem vinda na roda, mas vista com desdém em postos de comando. Essa situação tende a ser revertida, afinal, quem joga, quem ginga, também pode dar rasteira na discriminação – ancorada no frágil discurso contra o “sexo frágil” – e conquistar o seu lugar ao sol no que diz respeito à liderança na capoeira.

Quando os homens capoeiristas compreenderem que a presença da mulher em todas as instâncias da capoeira contribuirá para o fortalecimento de todos, essa dicotomia vai desaparecer, a exemplo do que ocorreu no mercado de trabalho e no controle familiar, onde os dois sexos atuam com igualdade de chances e responsabilidades.

(*) A autora é capoeirista, estudante de Direito e Presidenta da Associação de Capoeira Ladainha .

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