O 13 de Maio e a Mulher Brasileira
“A mulher escrava, ao menos podia odiar os seus algozes; a mulher fidalga tinha de amar os dela”. Vitória Gama *
A pessoa negra, durante a escravidão, e a mulher da nobreza, pode-se afirmar, trilharam caminhos paralelos, próximos, por todo aquele período, avançando pela vida da República. Apesar das suas agruras o negro foi dela aliado, o único aliado. Sem do negro as crenças e a urdidura da alcovitice, milhões de mulheres fidalgas não teriam conhecido um único instante de felicidade no amor, como alguns momentos prazerosos no dia a dia.
O 13 DE MAIO E AS LIÇÕES DO EXILIO.
A Lei Áurea já nos consumiu comemorações ruidosas, festas; escritos e considerações, por quase um século, atribuindo-lhe valores e utilidades que não teve. Que não tem. Sua autoria “dada” à Princesa Isabel, teve o objetivo de materializar a gratidão da mulher ao negro: “ser a sua paga, única”. Feito o pagamento, a mulher, induzida pelos mesmos “senhores”, vira as costas ao negro no seu abandono, dele. A Lei Áurea, – no presente como no passado – uma ante-Lei. Em não criar punição de nenhuma espécie ou em não aventar com a indenização ao escravizado de quatro séculos, “se acaba com a escravidão, perpetua a figura do escravo”. Procede dizer, à Lei Áurea deve-se a continuidade de focos de trabalho escravo, em pleno Séc. XXI; e pior, sem punição alguma, sob o amparo da anterioridade. Ainda assim o negro, por longos anos o acolheu, o festejou. O ver a desimportância da Lei Áurea não se deve à “ingratidão do negro”: Não. Devemo-lo ao exílio! O exílio tem sido de grande importância para o negro brasileiro.
-“A escassez de mulheres brancas gerou zonas de confraternização entre vence-dores e vencidos, entre senhores e escravos”, constata o fidalgo Gilberto Freyre, quando no exílio em 1930, confraterniza-se com o negro, e começa a escrever Casa-Grande e Senzala, inaugurando a segunda fase dos estudos sociais do Brasil. Mas G. Freyre, no que pese todo o esforço, ver na História da Pátria, o conto de uma banda só – sem o testemunho da mulher – “creio que não há publicado no Brasil um só diário escrito por mulher”, confidências incompletas, trucadas ante o medo – comidas por cupins nas madeiras dos confessionários; as completas de verdade foram enterradas com as mães pretas. E mais.
-“Desde os anos sessenta, as descrições fantasiosas do passado do Brasil eram refutadas por cientistas sociais como Florestan Fernandes e Fernando Henrique Cardoso, etc…. Em geral estes autores refutavam o significado do 13 de Maio…” (Mario Giesti). Sabem onde se encontravam os dois? No exílio. Também no exílio Darcy Ribeiro esboçou o seu “O Povo Brasileiro”, de conteúdo épico e dissertação brilhante. Prevendo futuro auspicioso sem apontar para a reparação dos erros do passado, como se fosse possível. Retrocederíamos, nesta linha a Nina Rodrigues. Médico e pesquisador dos mais brilhantes, sentia-se um “exilado” dos prestígios. Nina fez o que lhe foi possível. Para fechar este tópico socorro-me do médico e historiador Luis Mir – (Guerra Civil Estado e Trauma): A história da escravidão, da abolição e da pós-libertação foi uma luta contínua pela etnia dominante para evitar, em qualquer grau ou acordo, a reconciliação com as etnias subjugadas”.
A Lei Áurea já nos consumiu comemorações ruidosas, festas; escritos e considerações, por quase um século, atribuindo-lhe valores e utilidades que não teve. Que não tem. Sua autoria “dada” à Princesa Isabel, teve o objetivo de materializar a gratidão da mulher ao negro: “ser a sua paga, única”. Feito o pagamento, a mulher, induzida pelos mesmos “senhores”, vira as costas ao negro no seu abandono, dele. A Lei Áurea, – no presente como no passado – uma ante-Lei. Em não criar punição de nenhuma espécie ou em não aventar com a indenização ao escravizado de quatro séculos, “se acaba com a escravidão, perpetua a figura do escravo”. Procede dizer, à Lei Áurea deve-se a continuidade de focos de trabalho escravo, em pleno Séc. XXI; e pior, sem punição alguma, sob o amparo da anterioridade. Ainda assim o negro, por longos anos o acolheu, o festejou. O ver a desimportância da Lei Áurea não se deve à “ingratidão do negro”: Não. Devemo-lo ao exílio! O exílio tem sido de grande importância para o negro brasileiro.
-“A escassez de mulheres brancas gerou zonas de confraternização entre vence-dores e vencidos, entre senhores e escravos”, constata o fidalgo Gilberto Freyre, quando no exílio em 1930, confraterniza-se com o negro, e começa a escrever Casa-Grande e Senzala, inaugurando a segunda fase dos estudos sociais do Brasil. Mas G. Freyre, no que pese todo o esforço, ver na História da Pátria, o conto de uma banda só – sem o testemunho da mulher – “creio que não há publicado no Brasil um só diário escrito por mulher”, confidências incompletas, trucadas ante o medo – comidas por cupins nas madeiras dos confessionários; as completas de verdade foram enterradas com as mães pretas. E mais.
-“Desde os anos sessenta, as descrições fantasiosas do passado do Brasil eram refutadas por cientistas sociais como Florestan Fernandes e Fernando Henrique Cardoso, etc…. Em geral estes autores refutavam o significado do 13 de Maio…” (Mario Giesti). Sabem onde se encontravam os dois? No exílio. Também no exílio Darcy Ribeiro esboçou o seu “O Povo Brasileiro”, de conteúdo épico e dissertação brilhante. Prevendo futuro auspicioso sem apontar para a reparação dos erros do passado, como se fosse possível. Retrocederíamos, nesta linha a Nina Rodrigues. Médico e pesquisador dos mais brilhantes, sentia-se um “exilado” dos prestígios. Nina fez o que lhe foi possível. Para fechar este tópico socorro-me do médico e historiador Luis Mir – (Guerra Civil Estado e Trauma): A história da escravidão, da abolição e da pós-libertação foi uma luta contínua pela etnia dominante para evitar, em qualquer grau ou acordo, a reconciliação com as etnias subjugadas”.
AÇÕES DESENCONTRADAS PARA UM MESMO PROBLEMA
Nestas condições, 120 anos depois, em nada mudou a condição do negro, nem as relações sociais da mulher. A mulher, (no rigorismo da outra vítima), é o que se pode chamar de vítima de si mesma; o negro, vítima da sociedade que ajudou a construir, como ninguém. Sim, a mulher, é responsável pela criação e formação moral e social do homem de amanhã; também da futura mulher – esta preparada para continuar a ser vítima; aquele para continuar opressor. É bom lembrarmos de que o negro chegou ao Parlamento, o cerne do Poder, muito antes da mulher, ainda no Império. A mulher só o alcança na segunda metade do Séc. XX. A mulher não “viu” o alcance da universalidade do voto; o negro nunca pôde exercitá-lo. Com este rescaldo o Brasil não andou no construir da Nação. O Estado Republicano nunca teve vida superior a 20 anos, por não propiciar uma única proposta com vistas a integração desta outra banda da nacionalidade, o negro.
Em toda a vida Republicana os esforços do Estado são para debitar a questão do negro nas necessidades sociais. Não há como extrair daquela a particularidade deixada pela escravidão. Enquanto ela não for totalmente sanada a mulher brasileira continuará se esquivando a esmo, sozinha; o negro brasileiro lutando contando com suas crenças e suas artes, só, ou quase; as dores da Nação – continuarão as mesmas – de entranhas:
“Como Deus foi servido que eu mandasse matar meu filho”, peça de defesa aos padres coadjutores, de um nobre, (dentre os pais da prostituição infantil), “traído” pela manteúda e o filho mais moço, “lavagem de honra” levada a cabo pelo filho mais velho (1).
“Senhores….. Meu filho! é mais, é meu filho”. Tragédia no Lar, Castro Alves
A primeira mãe, matilha preta cobrindo a cabeça, obrigada a solidarizar-se com o marido, diante do corpo do filho “ingrato”. A segunda, escrava – “nem mais um passo cobardes!…. uma doida a gargalhar”, ao ter o filho arrancado dos braços para venda.
“Ninguém luta só, ninguém dança só” relembra o Ministro Gilberto Gil, apresentando na Europa a Capoeira – das manifestações mais vigorosas de resistência do negro brasileiro. – “Criada para o prazer e o combate”, ensina o Ministro.(2) Enquanto isto – Nas areias de Copacabana, outrora um alfinim, mulheres também outrora fidalgas rememoram, velam, choram seus filhos – “plantando um mar de rosas vermelhas…”
“Uma bala perdida os achou…” – “estava na hora certa, no lugar errado”, justifica o mesmo sistema. Tanto faz, a Ministra Presidenta do STF, dá de ombros, solidária com os “senhores” do Séc. XXI, no “direito e no dever de matar bandidos” pregamos, a Nação.
Extinta, ou esvaída a escravidão ficou a dívida: sim, porque a História não tem fim, é um processo. E esta dívida terá de ser paga. E esta paga será o menor dos preços e o menor dos custos. A mulher brasileira é o melhor e mais apropriado segmento para desfraldar a bandeira da Indenização do Negro Brasileiro. Aquela mulher – que sem meios, com um aliado escravizado – amargou as suas dores morais e de entranhas; (essa mulher) – hoje, com um aliado capaz de esboçar reações – não pode esconder-se, insular a si e ou aos seus, ao invés de procurar uma solução pactuada.
Nestas condições, 120 anos depois, em nada mudou a condição do negro, nem as relações sociais da mulher. A mulher, (no rigorismo da outra vítima), é o que se pode chamar de vítima de si mesma; o negro, vítima da sociedade que ajudou a construir, como ninguém. Sim, a mulher, é responsável pela criação e formação moral e social do homem de amanhã; também da futura mulher – esta preparada para continuar a ser vítima; aquele para continuar opressor. É bom lembrarmos de que o negro chegou ao Parlamento, o cerne do Poder, muito antes da mulher, ainda no Império. A mulher só o alcança na segunda metade do Séc. XX. A mulher não “viu” o alcance da universalidade do voto; o negro nunca pôde exercitá-lo. Com este rescaldo o Brasil não andou no construir da Nação. O Estado Republicano nunca teve vida superior a 20 anos, por não propiciar uma única proposta com vistas a integração desta outra banda da nacionalidade, o negro.
Em toda a vida Republicana os esforços do Estado são para debitar a questão do negro nas necessidades sociais. Não há como extrair daquela a particularidade deixada pela escravidão. Enquanto ela não for totalmente sanada a mulher brasileira continuará se esquivando a esmo, sozinha; o negro brasileiro lutando contando com suas crenças e suas artes, só, ou quase; as dores da Nação – continuarão as mesmas – de entranhas:
“Como Deus foi servido que eu mandasse matar meu filho”, peça de defesa aos padres coadjutores, de um nobre, (dentre os pais da prostituição infantil), “traído” pela manteúda e o filho mais moço, “lavagem de honra” levada a cabo pelo filho mais velho (1).
“Senhores….. Meu filho! é mais, é meu filho”. Tragédia no Lar, Castro Alves
A primeira mãe, matilha preta cobrindo a cabeça, obrigada a solidarizar-se com o marido, diante do corpo do filho “ingrato”. A segunda, escrava – “nem mais um passo cobardes!…. uma doida a gargalhar”, ao ter o filho arrancado dos braços para venda.
“Ninguém luta só, ninguém dança só” relembra o Ministro Gilberto Gil, apresentando na Europa a Capoeira – das manifestações mais vigorosas de resistência do negro brasileiro. – “Criada para o prazer e o combate”, ensina o Ministro.(2) Enquanto isto – Nas areias de Copacabana, outrora um alfinim, mulheres também outrora fidalgas rememoram, velam, choram seus filhos – “plantando um mar de rosas vermelhas…”
“Uma bala perdida os achou…” – “estava na hora certa, no lugar errado”, justifica o mesmo sistema. Tanto faz, a Ministra Presidenta do STF, dá de ombros, solidária com os “senhores” do Séc. XXI, no “direito e no dever de matar bandidos” pregamos, a Nação.
Extinta, ou esvaída a escravidão ficou a dívida: sim, porque a História não tem fim, é um processo. E esta dívida terá de ser paga. E esta paga será o menor dos preços e o menor dos custos. A mulher brasileira é o melhor e mais apropriado segmento para desfraldar a bandeira da Indenização do Negro Brasileiro. Aquela mulher – que sem meios, com um aliado escravizado – amargou as suas dores morais e de entranhas; (essa mulher) – hoje, com um aliado capaz de esboçar reações – não pode esconder-se, insular a si e ou aos seus, ao invés de procurar uma solução pactuada.
Assim, o 13 de Maio toma o seu lugar na História: Apenas um ato burocrático.
E, é isto aí senhoras do Brasil; e, é isto ai meninas brasileiras, – à dança, à luta:
-“Capoeira é pra homem menino e mulher”.
* Da. Vitória Gama: mulher negra, garimpeira, Professora, rezadeira, cantadeira – da região do antigo Gentil D’Ouro, vale médio do São Francisco, na Bahia.
(1) Tristão de Alencar Araripe, “Pater-Famílias no Brasil dos tempos coloniais”
(2) Discurso de Gil em Genebra, Suíça, numa Roda – 19-08-2004
André Pêssego – [email protected]
(1) Tristão de Alencar Araripe, “Pater-Famílias no Brasil dos tempos coloniais”
(2) Discurso de Gil em Genebra, Suíça, numa Roda – 19-08-2004
André Pêssego – [email protected]