Entrevista com Mestre Bigodinho
Mestre Condena Política na Capoeira
Entrevista com Mestre Bigodinho, Angoleiro da Bahia, no Dia da Independência da Bahia (2 Julho de 2004)
Benedito dos Santos (Bené)
João Pessoa-PB
Fev – 2005
Falar em cultura popular da Bahia é falar da própria Bahia. Em recente viagem realizada a Salvador, até como intuito de elaborar material para o curso de especialização em jornalismo cultural, pude observar vários aspectos de se ver a cultura popular baiana.
A entrevista se deu na Capital da Capoeira Angola, no dia 2 de julho de 2004, dia da Independência da Bahia.
Há cultura popular produzida para turista, onde estão presentes os traços da indústria cultural; já para o povo baiano, o que vale é a alegria, e nesse contexto as roupagens se misturam.
Cultura popular mesmo, aquela feita pelas mãos sedentas de seus cultuadores, a autentica, é deixada de lado. Porquê?. Acredito que prevalece a teoria do ultrapassado, e do "sem valor cultural". No contexto geral da entrevista feita com Reinaldo Santana, internacionalmente conhecido como Mestre Bigodinho, pudemos observar que esta nossa visão reflete-se nas palavras do mestre.
Partindo da inferência da Industria Cultural, perguntei ao mestre a importância da capoeira no desfile do dia da independência da Bahia. [….] Depois de alguns segundos pensativo, o mestre, com seu saber popular, comenta:
"o dia dois de julho é mais velho que a capoeira, a capoeira nunca acompanhou o dia da independência. Acontece que agora é lazer, um esporte, um samba. A capoeira agora é tudo. Por isso, ela foi incorporada ao dois de julho, porque antes não tinha não!. Agora, particularmente, a capoeira não é mais capoeira. A capoeira está mais que capoeira. É política!.É política!." – frisou o mestre Bigodinho. Continuando seu pensamento, o mestre diz mais. "porque você vê, se tiver um capoeira e não tiver um político no meio não é capoeira!".
Na visão do mestre Bigodinho, praticante que passou por várias gerações de mestres, existe poucas esperanças de uma capoeira voltada para a sua realidade, isto visto pelo próprio Estado da Bahia, berço da historia da Capoeira.
"Eu não estou dizendo que a capoeira é só política, o que eu estou dizendo é o que estou vendo dentro. No meu tempo não tinha "política", nem no tempo dos meus mestres… digo meus mestres, porque meus mestres são Mestres Waldemar, Traíra e Zacarias… esse pessoal mais antigo. E hoje em dia, a capoeira é uma beleza! (…) naquele tempo a capoeira que eu via na rua (…) naquele tempo de 1960 em diante, só via mestre Waldemar, depois foi crescendo, eu também. Fui chegando, os mestres morreram e ficou pra gente, agora cada qual que jogue como sabe, como puder, porque a capoeira é uma traição, a pessoa que sabe jogar capoeira, nunca tira os olhos de cima do adversário, e a pessoa que brinca capoeira hoje em dia, tem que saber entrar e sair.."
Entrevista com Mestre Bigodinho, Angoleiro da Bahia, no Dia da Independência da Bahia (2 Julho de 2004)
Benedito dos Santos (Bené)
João Pessoa-PB
Fev – 2005
Falar em cultura popular da Bahia é falar da própria Bahia. Em recente viagem realizada a Salvador, até como intuito de elaborar material para o curso de especialização em jornalismo cultural, pude observar vários aspectos de se ver a cultura popular baiana.
A entrevista se deu na Capital da Capoeira Angola, no dia 2 de julho de 2004, dia da Independência da Bahia.
Há cultura popular produzida para turista, onde estão presentes os traços da indústria cultural; já para o povo baiano, o que vale é a alegria, e nesse contexto as roupagens se misturam.
Cultura popular mesmo, aquela feita pelas mãos sedentas de seus cultuadores, a autentica, é deixada de lado. Porquê?. Acredito que prevalece a teoria do ultrapassado, e do "sem valor cultural". No contexto geral da entrevista feita com Reinaldo Santana, internacionalmente conhecido como Mestre Bigodinho, pudemos observar que esta nossa visão reflete-se nas palavras do mestre.
Partindo da inferência da Industria Cultural, perguntei ao mestre a importância da capoeira no desfile do dia da independência da Bahia. [….] Depois de alguns segundos pensativo, o mestre, com seu saber popular, comenta:
"o dia dois de julho é mais velho que a capoeira, a capoeira nunca acompanhou o dia da independência. Acontece que agora é lazer, um esporte, um samba. A capoeira agora é tudo. Por isso, ela foi incorporada ao dois de julho, porque antes não tinha não!. Agora, particularmente, a capoeira não é mais capoeira. A capoeira está mais que capoeira. É política!.É política!." – frisou o mestre Bigodinho. Continuando seu pensamento, o mestre diz mais. "porque você vê, se tiver um capoeira e não tiver um político no meio não é capoeira!".
Na visão do mestre Bigodinho, praticante que passou por várias gerações de mestres, existe poucas esperanças de uma capoeira voltada para a sua realidade, isto visto pelo próprio Estado da Bahia, berço da historia da Capoeira.
"Eu não estou dizendo que a capoeira é só política, o que eu estou dizendo é o que estou vendo dentro. No meu tempo não tinha "política", nem no tempo dos meus mestres… digo meus mestres, porque meus mestres são Mestres Waldemar, Traíra e Zacarias… esse pessoal mais antigo. E hoje em dia, a capoeira é uma beleza! (…) naquele tempo a capoeira que eu via na rua (…) naquele tempo de 1960 em diante, só via mestre Waldemar, depois foi crescendo, eu também. Fui chegando, os mestres morreram e ficou pra gente, agora cada qual que jogue como sabe, como puder, porque a capoeira é uma traição, a pessoa que sabe jogar capoeira, nunca tira os olhos de cima do adversário, e a pessoa que brinca capoeira hoje em dia, tem que saber entrar e sair.."
JCap – Mestre, "essa abertura" pela sociedade, ela é real e tem um aproveitamento pela juventude?
M. Bigodinho – A capoeira hoje em dia não pode se afirmar. Sabe por quê? Porque tem lobo engolindo lobo, e nunca engole o lobo certo. Agora, no meu tempo, a capoeira não prestava, no meu tempo não. No meu tempo, no tempo do meu mestre, não jogava homem, com menino e nem mulher. Hoje em dia mulher joga, menino joga. Joga quem puder, salve-se quem puder, agora tudo é bom… E por que os mestres de capoeira de hoje em dia não se unem para fazer assim? Pelo menos, né, dizer assim: "olha mestre, o senhor vai dar ali uma aula aos meus meninos"… Uma aula de que? De canto! Aula de que? De pandeiro! Aula de que?! De cantoria! Tudo bem, você pode ir, chega lá (…) o que meu mestre fazia comigo eu não posso fazer com os alunos deles, por que eles (os alunos) querem me bater, então, eu não vou designar funções não. Eu digo a você, a capoeira tá crescendo, más tá se desvalorizando, porque não tem uma pessoa que conheça e tome a frente prá dizer é isso e é isso! e vai até o fim. Porque naquele tempo, quando se falava na palavra "Mestre" os alunos respeitavam, brincavam, tudo legal, tudo mais…
Continuando seu raciocínio, o mestre Bigodinho relata. "Hoje em dia tem mestre, contra-mestre, trenel, ave Maria!…que eu nunca tinha visto isto. Instrutor, professor. E interessante! Vem perguntar a mim, que não sei de nada?", interroga o mestre!
JCap – Mestre Bigodinho, qual a capoeira ideal nos dias de hoje na sua concepção?
M. Bigodinho – "A capoeira de hoje em dia, não é como a capoeira de antigamente, porque no meu tempo, enquanto mais dos meus mestres, a capoeira era jogada, hoje em dia, a capoeira é pulada, dou uma pernada pra cima, escalou uma perna, já é capoeira e no meu tempo, seu mestre (…) hoje eles nem sabem o que é uma chamada", sentencia o mestre. Continuando seu pensamento arremata: – "tinha que vir fechado, se viesse aberto apanhava, porque hoje em dia, quando você faz uma chamada, o cara dá um pulo, dá dois pulos, três pulos, outro pulo, depois vêm, tá errado " a chamada na capoeira é pra descanso, lhe chamou, você tem que atender, não é fazer mais do que está se fazendo", – finalizou o mestre Bigodinho.
Na foto. Mestre Dinelson, Mestre Bigodinho & Bené
Bené é pesquisador de Cultura Popular da Paraíba, e integrante do Grupo Zumbi de Cultura Popular
Autor: Benedito dos Santos (Bené)
M. Bigodinho – A capoeira hoje em dia não pode se afirmar. Sabe por quê? Porque tem lobo engolindo lobo, e nunca engole o lobo certo. Agora, no meu tempo, a capoeira não prestava, no meu tempo não. No meu tempo, no tempo do meu mestre, não jogava homem, com menino e nem mulher. Hoje em dia mulher joga, menino joga. Joga quem puder, salve-se quem puder, agora tudo é bom… E por que os mestres de capoeira de hoje em dia não se unem para fazer assim? Pelo menos, né, dizer assim: "olha mestre, o senhor vai dar ali uma aula aos meus meninos"… Uma aula de que? De canto! Aula de que? De pandeiro! Aula de que?! De cantoria! Tudo bem, você pode ir, chega lá (…) o que meu mestre fazia comigo eu não posso fazer com os alunos deles, por que eles (os alunos) querem me bater, então, eu não vou designar funções não. Eu digo a você, a capoeira tá crescendo, más tá se desvalorizando, porque não tem uma pessoa que conheça e tome a frente prá dizer é isso e é isso! e vai até o fim. Porque naquele tempo, quando se falava na palavra "Mestre" os alunos respeitavam, brincavam, tudo legal, tudo mais…
Continuando seu raciocínio, o mestre Bigodinho relata. "Hoje em dia tem mestre, contra-mestre, trenel, ave Maria!…que eu nunca tinha visto isto. Instrutor, professor. E interessante! Vem perguntar a mim, que não sei de nada?", interroga o mestre!
JCap – Mestre Bigodinho, qual a capoeira ideal nos dias de hoje na sua concepção?
M. Bigodinho – "A capoeira de hoje em dia, não é como a capoeira de antigamente, porque no meu tempo, enquanto mais dos meus mestres, a capoeira era jogada, hoje em dia, a capoeira é pulada, dou uma pernada pra cima, escalou uma perna, já é capoeira e no meu tempo, seu mestre (…) hoje eles nem sabem o que é uma chamada", sentencia o mestre. Continuando seu pensamento arremata: – "tinha que vir fechado, se viesse aberto apanhava, porque hoje em dia, quando você faz uma chamada, o cara dá um pulo, dá dois pulos, três pulos, outro pulo, depois vêm, tá errado " a chamada na capoeira é pra descanso, lhe chamou, você tem que atender, não é fazer mais do que está se fazendo", – finalizou o mestre Bigodinho.
Na foto. Mestre Dinelson, Mestre Bigodinho & Bené
Bené é pesquisador de Cultura Popular da Paraíba, e integrante do Grupo Zumbi de Cultura Popular
Autor: Benedito dos Santos (Bené)